Vale brasil(eira)

24-05-2011 08:59

 

Aldenor Cunha Rebouças Junior

Advogado, mestrando em Direito Internacional Econômico pela Universidade Católica de Brasília

E-mail: reboucasjr@ig.com.br

 

Está previsto para o dia 22 de maio, no terminal da Vale em Ponta da Madeira, em São Luís (MA), o primeiro carregamento do maior navio graneleiro do mundo. Trata-se do “Vale Brasil”, com capacidade de carregar 400 mil toneladas, o primeiro das sete embarcações encomendadas ao estaleiro sul coreano Daewoo Shipbuilding pela mineradora Vale. Outros 12 navios com igual capacidade estão contratados com o estaleiro chinês Rongsheng Shipbuilding.

O total do contrato coreano é da ordem de US$ 748 milhões, enquanto a compra chinesa totaliza US$ 1,6 bilhão. O Export-Import Bank of China e o Bank of China concederam um financiamento de US$ 1,229 bilhão, com pagamento ao longo de 13 anos, para a construção dos 12 navios encomendados ao estaleiro sínico, que receberão o nome de Chinamax quando estiverem prontos.

Enquanto os acionistas da Vale comemoram o lucro de R$ 30,1 bilhões em 2010 e de R$ 11,29 bilhões no primeiro trimestre de 2011, conforme informações da mineradora, os maranhenses e demais brasileiros que forem testemunhar o primeiro carregamento não poderão estufar patrioticamente o peito. É que a bandeira que está hasteada no “Vale Brasil” é a de Singapura, local de registro da embarcação.

Ninguém verá a bandeira brasileira tremulando no navio e a mesma decepção se repetirá nos primeiros carregamentos dos outros 18 supergraneleiros comprados pela Vale naqueles países asiáticos. Ao tempo das contratações, a decisão da mineradora foi fortemente criticada pelo ex-presidente Lula, que defendia a prioridade da contratação dos estaleiros brasileiros. A Vale alegou que o preço de US$ 236 milhões, por unidade, e o prazo de entrega para 2015 inviabilizaram a contratação do Estaleiro Atlântico Sul, situado em Pernambuco, pois o preço asiático não chegava a US$ 110 milhões por navio e o prazo de entrega findava em 2013.

Os noticiários se ocuparam exclusivamente da tensão entre as razões do Estado brasileiro e a insaciável fome de lucro dos acionistas de uma companhia dita brasileira, não percebendo que o episódio trazia como pano de fundo o esforço do governo brasileiro para conter o (ab)uso do Capitalismo de Estado praticado pela China e Coréia. O Capitalismo de Estado é uma forma de capitalismo em que determinado país elege algumas empresas para dominar setores econômicos, com o intuito de gerar riquezas que serão direcionadas da maneira que os políticos bem entendam. O Estado, assim, participa do mercado mirando principalmente ganhos políticos, não econômicos, como adverte Ian Bremmer (O fim do livre mercado).

Se analisarmos a cena a partir do princípio lucrativo do Capitalismo de Mercado, a mineradora agiu corretamente, pois os preços asiáticos eram mais baixos que os nacionais e o prazo de entrega mais curto para a geração de lucro aos seus acionistas. Porém, se mudarmos as lentes para o Capitalismo de Estado, a Vale atendeu aos interesses chineses e coreanos, contra o Estado brasileiro, uma vez que o fortalecimento da indústria naval, a geração de empregos, renda e tributos ocorreram lá, e não aqui.

A China não fez a mínima questão de esconder sua intenção imperialista, pois os dois bancos que concederam o financiamento à Vale possuem somente o Estado chinês como acionista! Ou seja, mesmo os juros do empréstimo reverterão em favor da maximização do poder do Estado sínico. Deve ser por isso que os navios lá produzidos serão batizados de Chinamax.

Do ano passado para cá a Vale lucrou mais de R$ 41 bilhões. A opção de contratar os estaleiros brasileiros, ainda que com custo maior que o dobro das asiáticas, revelaria o compromisso da empresa com os objetivos do Estado brasileiro. Se o minério é brasileiro, parte da riqueza por ele gerada deve ficar aqui.

No período que se seguiu à descoberta do território brasileiro por Portugal, durante boa parte do século XVI, o vocábulo "brasileiro" foi dado aos comerciantes de pau-brasil, designando exclusivamente o nome da profissão. No entanto, desde muito antes da independência do Brasil, já era comum se atribuir o gentílico "brasileiro" a uma pessoa nascida ou residente na então colônia (Wikipedia).

A decisão da Vale, do ponto de vista patriótico, foi um desastre! E se isso continuar, talvez o mundo esqueça que somos brasileiros e tenhamos que atender por “minereiros” ou “ferreiros”. Já temos o navio Vale Brasil, agora precisamos de uma Vale brasileira, verdadeiramente. (Fonte: O Estado do Maranhão)

 

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